O discente indígena, Márcio Kaingang Katahn Manoel Antônio – natural de Cacique Doble -, do curso de Direito da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), defendeu na quinta-feira, 26, seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Márcio Kaingang é o primeiro índígena a se formar no curso de Direito do Campus Santana do Livramento. No trabalho, intitulado “Práticas Penais na Comunidade Indígena Kaingang de Cacique Doble/RS”, ele analisa as práticas punitivas atualmente adotadas pelo povo a que pertence.
O trabalho foi orientado pelo professor Marcelo Mayora e vem sendo desenvolvido desde o começo da graduação do discente. Recebeu, em 2019, o prêmio de melhor trabalho das Ciências Sociais Aplicadas no 11° Salão Internacional de Ensino, Pesquisa e Extensão (Siepe).
Márcio Kaingang nasceu e cresceu na Terra Índigena Kaingang, no município de Cacique Doble, desde o final do ensino médio tinha desejo de cursar Direito. Também formado em magistério e Pedagogia, Márcio vê na nova graduação uma oportunidade de trabalhar em prol da sua comunidade. “Percebia a falta desse profissional na minha realidade local, sobretudo a pessoa que poderia defender os direitos indígenas na comunidade onde nasci”, relata. Segundo ele, outro aspecto que o motivou foi a defesa dos direitos das demais etnias indígenas do Brasil.
A graduação na Unipampa também proporcionou a Márcio Kaingang experimentar diferentes formas de interação social e interculturalidade. A partir desses choques culturais, o estudante começou a refletir sobre as práticas penais estatais em relação às indígenas que, de acordo com Márcio, são pautadas pela ressocialização e penas alternativas ao encarceramento. “A pesquisa me fez compreender melhor a interpretação das leis que dão um amparo jurídico às práticas punitivas, a organização social, política e autonomia, no que compete às lideranças indígenas”, destaca.
De acordo com o professor Marcelo Mayora, a pesquisa colabora para o entendimento comparativo do sistema penal estatal e os sistemas penais dos povos indígenas no Brasil, em particular do povo Kaingang. “O trabalho dele, realizado a partir de um diálogo intercultural e do acolhimento de saberes, foi muito importante para nosso curso e para a Universidade Federal do Pampa”. O docente também destacou a relevância para a comunidade do discente na manutenção das suas práticas tradicionais de resolução de conflitos.
Além disso, como aponta Márcio Kaingang, o trabalho contribui para indicar caminhos e alternativas para a justiça penal estatal. “Penso que a pesquisa feita pode contribuir aos não indígenas nos estudos sobre a punição, no campo do direito penal e da criminologia, bem como da antropologia jurídica”, acrescenta o discente.
Dados da Pró-Reitoria de Graduação da Unipampa, apontam que, nos 15 anos da instituição, formaram-se 31 discentes indígenas nos diferentes cursos da Universidade. A Unipampa também possui ações afirmativas e o Processo Seletivo Específico para Indígenas Aldeados e Moradores remanescentes de Comunidades de Quilombos, que estimulam o ingresso e permanência de pessoas destas comunidades no ensino superior.
*Por: Micael dos Santos Olegário/Unipampa